Nunca tinha ouvido falar em Debora Diniz e não sou um profundo admirador do escritor, professor e influenciador Olavo de Carvalho, mas algo aguçou meu interesse ao ser exposto ao convite – publicado recentemente pela revista Época – da antropóloga da UnB ao escritor e professor autônomo de filosofia.
O tom auto-referente, fundado em argumentos de autoridade e ad hominem, me fizeram nascer a vontade de pesquisar o tal currículo Lattes supostamente invejável, alardeado por Debora no texto.
Na carta aberta/convite, a antropóloga se dirige ao escritor dizendo que Busquei seu currículo na Plataforma Lattes, mas não o localizei. para logo em seguida explicar que Se der uma espiada no meu currículo, verá que falo sobre aborto porque já fiz pesquisas, publiquei artigos e ganhei prêmios. Arrisco dizer que sou reconhecida na comunidade acadêmica internacional. Como tudo na ciência, até esse deslize de adjetivo no texto preciso comprovar. No meu caso, reconhecimento pode ser o prêmio Jabuti concedido ao meu livro sobre a epidemia de Zika no Brasil ou a recente homenagem da Faculdade de Direito da Universidade de Harvard.
Mordi a isca! Fui dar uma espiada no currículo da Debora.
Nos últimos três dias li uma série de artigos acadêmicos, textos de opinião e assisti também a alguns dos vídeos referenciados no extenso currículo acadêmico da intelectual, publicado na famosa plataforma do CNpQ.
Claro que não tive tempo de esmiuçar toda a sua pesquisa estabelecida sobre o tripé fundamental do ativismo progressista: “machismo” + “homofobia” + “racismo contra afrodescentes”.
Debora esteve envolvida em muitos projetos de pesquisa desde 2001, com destaque para estudos sobre discurso heteronormativo nos livros didáticos, violência contra a mulher, violência contra a mulher negra, aborto, socioepidemiologia do Zika virus associada à saúde feminina e violência homofóbica.
Neste post vou tratar de algumas das produções conduzidas pela moça intelectual no campo da homofobia, já tenho em mente uma continuação deste post falando sobre a pesquisa dela em violência contra a mulher, sobre a qual já li parte do material disponível em seu Lattes.
Ainda preciso folhear seus textos sobre epidemiologia do Zika virus e sobre aborto, temas sobre os quais ela tem escrito bastante material nos últimos anos, material este que ainda não tive tempo de ler.
LIVROS DIDÁTICOS E HOMOFOBIA (?)
Logo no primeiro parágrafo do primeiro artigo que baixei, observo que a antropóloga trata como fato a narrativa construída por décadas de fraude desenvolvida por Grupo Gay da Bahia e outras instituições.
Debora abre o seu Em foco: homofobia nos livros didáticos, um desafio ao silêncio, artigo acadêmico escrito a quatro mãos com uma outra pesquisadora da UnB, sustentando que o Brasil é o país com maior número de assassinatos de LGBTs no mundo E QUE estes crimes são motivados por homofobia: Temos um dos maiores índices de assassinatos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais do mundo, somado às diferentes formas de agressão cotidianas por parte de nossas instituições sociais. Essas formas específicas de violência são designadas como homofobia.
Provavelmente a intelectual estaria certa em dizer que o Brasil é o país com maior número absoluto de assassinatos de LGBTs: com 60 mil homicídios ao ano, o Brasil deve ser o país com maior número absoluto de assassinato de qualquer categoria de pessoas: anões, canhotos, calvos, barrigudinhos… e também LGBTs. Ao inferir homofobia como motivação desta posição, Debora demonstra ignorância, superficialidade ou – até, quem sabe? – desonestidade intelectual.
Mas a violência homofóbica não é o foco deste artigo: na verdade o texto faz parte de um dossiê em que Debora pretende investigar, em conjunto com outros pesquisadores, se a presença as referências ao universo LGBT nos livros didáticos atende aos princípios teóricos aos quais ela se afilia.
Debora é adepta da Teoria Queer e toma como referencial teórico para suas pesquisas neste campo as noções expostas por Judith Butler, filósofa estadunidense que é uma das principais influências do feminismo de gênero contemporâneo.
Para Debora, como ela expõe ao falar sobre uma pesquisa patrocinada pela ONU Mulheres e pelo Instituto Avon sobre violência contra a mulher nas universidades brasileiras, ninguém nasce homem nem mulher nem trans, mas somos conduzidos aos padrões de comportamento masculino ou feminino por forma de pressões aculturadoras.
Debora é uma negacionista da evolução biológica (pelo menos no que diz respeito à forma como o processo evolutivo moldou os dimorfismos sexuais comportamentais e cognitivos em nossa espécie) , não compreende e não admite que milênios de pressões ecológicas sobre o genoma de nossa espécie dioica e sobre os genomas das espécies ancestrais à nossa moldaram padrões mentais estereotipicamente masculinos e femininos, padrões estes que foram adequados às exigências que nossos antepassados enfrentaram na luta por sobreviver e procriar efetivamente no mundo natural (e que, ainda que possam ter se tornado relativamente obsoletos como ferramentas para sobrevivência e sucesso reprodutivo no mundo industrial, ainda sobrevivem na forma de instintos inscritos em nosso material genético) e que vêm sendo robustamente evidenciados por pesquisadores cognitivos atuantes em diversas áreas das ciências biomédicas (dê uma pausa na leitura para assistir o primeiro episódio de uma série de documentários sobre este tema, no vídeo abaixo).
Debora – como boa parte de seus pares intelectuais formados em Ciências Sociais, vide vídeo acima – prefere acreditar que toda a concepção humana sobre o masculino e o feminino é fruto de meras pressões culturais acomodadoras de uma sociedade eminentemente patriarcal e anti-feminina.
É curioso que, nisto, Debora tenha algo a dar as mãos a Olavo: o escritor também não vê com bons olhos a Teoria Sintética da Evolução e os seus defensores.
No artigo seguinte do mesmo dossiê, intitulado Homofobia, silêncio e naturalização: Por uma narrativa da diversidade sexual, Debora (em parceria com a intelectual Tatiana Lionço) se debruça sobre dezenas de livros e dicionários que listavam entre os mais distribuídos às escolas do Ensino Básico brasileiro. Ela quer saber se o material didático ao qual as crianças brasileiras são expostas é ou não canal de propaganda homofóbica.
Ao longo de 18 páginas, a intelectual lamenta a ausência de referências a casais LGBTs nas ilustrações e textos dos livros didáticos. Também reclama de que – na parte que trata dos aparelhos reprodutores e do sexo – os livros didáticos de Biologia focam no aspecto reprodutivo, tratando o pênis como órgão inoculador de esperma, o escroto como órgão produtor de sêmen e de testosterona, a vagina como … outros intelectuais poderiam imaginar que os motivos pelos quais isto acontece são os mesmos pelos quais os mesmos livros de Biologia destacam as enzimas proteolíticas e a função dos dentes molares na mastigação e não os diferentes paladares nas comidas regionais nos capítulos sobre o Sistema Digestório, mas Debora problematiza a ausência de referência à homossexualidade e ao aspecto socio-afetivo da sexualidade nos capítulos sobre o Sistema Reprodutivo como sendo uma forma velada, não explícita, de homofobia.
Quanto aos dicionários, Debora e sua colega são ainda mais rígidas na avaliação: as intelectuais revisaram os principais títulos distribuídos às escolas e acreditam que a manutenção do verbete homossexualismo (politicamente incorreto, na visão delas) e a definição de travesti como homem que se veste de mulher são suficientes para categorizar os dicionários distribuídos às escolas como explicitamente homofóbicos.
Eu fiquei muito curioso para saber qual seria a correta definição do verbete travesti, segundo a intelectual, mas o texto não aponta qual deveria ser a definição correta, apenas indica a definição errada. Poxa!
VIOLÊNCIA HOMOFÓBICA
A intelectual da UnB apresenta, em seu Lattes, uma publicação organizada por ela própria e – novamente – mais uma colega, a intelectual Rosana Medeiros de Oliveira: o livro Noticias de homofobia no Brasil.
A obra é composta de diversos artigos, incluindo uma entrevista conduzida pela mesma Debora e oferecida pelo jurista, escritor e ativista LGBT argentino Daniel Borrillo.
No artigo escrito pela própria Debora, intitulado O escândalo da homofobia:
imagens de vítimas e sobreviventes, a intelectual seleciona casos de violência contra homossexuais e as narra através de uma prosa em tom emotivo, que exemplifico assim: Luiz Antônio morreu porque era gay. Um homem fora de uma norma que se postula como universal e absoluta para alguns — a heteronorma. Seu agressor é um personagem abstrato, descrito genericamente como um segurança de boate, um homem que corporificaria não apenas a masculinidade da norma hegemônica, mas a polícia da moral que persegue os transgressores mesmo em espaços protegidos para a sociabilidade marginal. (…) Assim, é preciso provar que a vítima habitava um corpo transgressor à heteronorma e, nas palavras de Sontag, ‘na maneira moderna de conhecer, é preciso que haja imagens para que algo se torne real’ (2003, p. 138). Mas como tornar real a alienação prévia do corpo de Eliwelton? Como representar o caráter existencial do futuro anterior de alguém morto como ‘assumidamente homossexual’?
Para além do texto altamente carregado de adjetivos, neologismos e termos deslocados dos seus significados mais comuns, Debora apresenta fotos de cadáveres, de vítimas em coma ou de enterros como modo de chamar a atenção.
Falha, contudo, no elemento mais central de um trabalho que pretenda se passar por científico neste campo de pesquisa: demonstrar que de fato as mortes que selecionou foram todas motivadas por homofobia, como anunciam os títulos do artigo e do livro.
O primeiro caso relatado por Debora é o de Luiz Antônio de Jesus, homem que foi encontrado desacordado e com traumatismo craniano em uma boate e que veio a falecer dias depois. Não se sabe ao certo se Luiz foi espancado ou caiu acidentalmente (as notícias mais recentes sobre o caso publicadas na grande imprensa diziam que a possibilidade de morte acidental era remota, de acordo com os laudos cadavéricos), também não está definida a autoria de um eventual espancamento (embora um segurança tenha sido apontado como suspeito) e – obviamente – não se sabe a motivação das supostas agressões.
Debora aplica aqui a mesma lógica utilizada por Grupo Gay da Bahia, ANTRA, Transgender Europe e UFRJ: morreu e era gay, logo tem que ter sido _ _ _ _ _ _ _ _ _.
Por falar em Grupo Gay da Bahia, no livro organizado por Debora a ONG notoriamente reconhecida pela produção de números anuais fraudulentos de mortes por homofobia no país é apresentada como fonte confiável de informação sobre o tema.
Debora menciona em sua carta a Olavo que para ser um intelectual acadêmico é preciso se submeter ao método científico de busca da verdade.
Me parece que você está precisando se submeter mais, Debora. Se submeta mais, que tá pouco.
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